Falhei com você, Machado de Assis

junho 28, 2020





Os clássicos têm seu valor, enredos interessantes, escrita impecável, mas fazer o que se as vezes tudo que a gente precisa é daquele romance adolescente bem clichê?

Alguns clássicos exigem certa concentração que, até mesmo pelo momento caótico em que estamos, nem sempre estamos dispostos a ter. A leitura é mais arrastada, detalhada, as coisas demoram mais de acontecer. Eu adoro essa riqueza de detalhes, mas depende também da minha paciência no momento.

Certos momentos eu só consigo ficar vidrada e devorar páginas e páginas para saber se Fani e Leo de Fazendo o meu filme vão ficar juntos (eu amo essa série de livros).

Fora esses fatores, são absolutamente comuns entre os leitores os períodos de “bloqueio literário” em que não conseguimos nos concentrar em uma leitura por mais interessante que ela seja. E, após esse período, é sempre bom ir com calma.

Já imaginou passar meses sem ler e voltar diretamente para as páginas de uma obra de Lima Barreto? Nunca tive essa experiência, mas imagino ser um baque bem grande.

Confesso que no ano passado li bem pouco além das minhas prioridades acadêmicas. Desde então, até o início do ano eu estive travada em um livro do Julio Cortázar que eu interrompi várias vezes para ler outras obras.

No início do ano, já um pouco “recuperada” do bloqueio, resolvi ler um livro aleatório do John Green que encontrei pela casa e foi impressionante a rapidez em que eu li. Tentei voltar para o livro anterior pensando “ok, agora estou conseguindo me concentrar melhor, vou ler esse livro bem mais rápido”, fui enganada. Pensei “socorro, como que eu quero ser culta se eu preferi John Green a Julio Cortázar”. Pensamento bobo, eu sei. A realidade é que o "nível de cultura" não tem absolutamente nada a ver com o quão renomado é aquele livro ou autor.

Gostaria de ressaltar que nem só de livros adolescentes vive o indivíduo e eu não sou nem um pouco contra os clássicos. Sou apaixonada por vários e acho que eles têm muito a nos ensinar. No entanto, a literatura, assim como a música, cinema e tantas outras, se renovam. E a experiência literária se torna mais completa quando você se permite explorar várias áreas.

Naquele momento eu era só uma jovem de 18 anos que se sentiu mais atraída por um livro com personagens de 17 do que um romance que se passa na França do século XIX (que é bom, apesar de eu não ter lido todo). E, pessoalmente, eu creio que o fator proximidade e representatividade também influenciam nos nossos gostos. 

É sim muito interessante ver como as coisas funcionavam em determinada época através da leitura, mas também é muito bom ver alguma história e pensar “nossa, eu já passei por uma situação parecida”. O processo de ler algo de época é intrigante porque, ao mesmo tempo que é esclarecedor, faz com que você se sinta incomodado com possíveis trechos preconceituosos. Sei que “são outros tempos e as ideias eram outras” e que nem sempre esse é o pensamento do autor, mas, se você se sente desconfortável, não precisa continuar.

Talvez algumas obras não tenham o estudo, ou a técnica, ou a experiência, ou a linguagem rebuscada de outras. Nem sempre o que é melhor tecnicamente é o que mais mexe com você e, cá entre nós, a gente não gosta só do que é bom. Qual é o problema em ler uma fanfic de alguém de 15 anos? Essa pessoa pode estar em processo de desenvolvimento, praticando, estudando e fazendo o melhor que pode. A escrita evolui e, para tal, é necessário apoio.

Curiosidade: aos 12 anos eu fui uma escritora de fanfic (espero que nunca descubram minhas histórias antigas).

De todo modo, existem vários escritores bons, várias obras maravilhosas e os mais diversos estilos. E eu falo isso também como uma jovem escritora.

Tudo bem se você tiver um estilo literário definido, se você quer ler aquilo e pronto. Mas que entenda que isso é pessoal e que não quer dizer nada sobre o intelecto de alguém.

Eu só quero chorar lendo aquele casalzinho fofo do ensino médio ficar junto, posso?

6 comentários

  1. Entendo o sentimento, ultimamente sinto bloqueio pra ler qualquer coisa mais complexa mas sempre me rendo aos romances simples, até mesmo em inglês. Talvez eu esteja cansada? Ou talvez eu seja apenas uma romântica... Mas de fato é muito gostoso ler algo sem pretensões maiores, só aquela leitura que traz conforto. A sua é uma delas! 🥰

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  2. Achei o texto incrível, Gabi! Eu acho que passei pelo sentimento inverso do que você descreve �� Sempre fui uma apaixonada por clássicos e não me dou muito bem lendo coisas novas, séries adolescentes (nem quando era adolescente). Mas mesmo amando clássicos, eu não conseguia ler antes por conta do tempo corrido. A quarentena me deu tempo pra devorar livros e eu já tô no 8º livro em três meses! Tô até assustada com a minha leitura, nunca fui uma devoradora de livros assim kkkk Mas sempre amei livros antigos, gosto de ver como era aquela época, do estilo dos autores, das histórias contadas de forma diferente com o que a gente tá acostumado a ver, das palavras, dos contextos, tudo. Por isso a literatura atual não me chama tanta atenção. Mas o que importa é ler e ser feliz lendo (e não sendo Olavo de Carvalho, já tá ótimo!��)

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  3. Já quero pra hoje essas fanficd dos 12. Amei Gaby, vc sempre me dando conforto de coisas que eu imaginava que era só eu que sentia... Não para de escrever nunca, ok?

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  4. Caraca é exatamente isso, já me senti muito mal por não conseguir ler certos livros ou não conseguir terminar por ter falas muito preconceituosas.

    De fato nem de livros clássicos vive o adolescente.

    Tô amando seus textos, são incríveis!

    Ps: quero o link das fanfics ok?

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  5. Perfeito! Acredito que é exatamente isso. Não há nada de errado em partilhar nosso tempo entre Goethe, Shelley, Machado de Assis e a (minha amada) Jojo Moyes, por exemplo. O importante é quanto cada história mexe com a gente, faz a gente mergulhar e "viver" dentro de cada episódio, de cada personagem com quem nos identificamos.

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