Eu tenho percebido uma coisa bem absurda na maneira como as pessoas (inclusive eu mesma) se relacionam. Não só uma, várias, mas essa em especial me chama a atenção. É o fingir não sentir.

Não o fingimento no sentido de fingir que não se importa, dar uma de difícil. Acho que as relações que tenho observado são de pessoas um pouco mais crescidinhas a ponto de saber que aquela relação cheia de barreiras e indiferenças de barreiras e indiferenças está mais para cansativo e que fulano não vai te responder na hora porque ele tem coisas para fazer.

Falo de um fingimento mais adoecedor. É uma gota de insegurança, uma pitada de sentimento de superioridade e, claro, um pouquinho de boas intenções (quem sabe até altruísmo). É um fingimento que afeta muito mais o fingidor do que o enganado.

É o disfarce dos sentimentos ruins. Aquele que corrói por dentro, que te deixa ansioso, que faz sentir o seu corpo te traindo em diversos momentos, mas você não cede. Não cedendo, você abre precedentes para uma futura explosão (o que pode ser muito pior).

Falo de sentimentos como ciúmes, insegurança, chateação, raiva e todos esses que corroem por dentro.

E por que é tão difícil assumir isso?

Minha tese baseada nas minhas observações e achismos é que estamos na era dos espiritualmente evoluídos. Não importa o que você esteja sentindo, você é superior, autossuficiente e evoluído para lidar com isso sozinho e superar antes que alguém perceba o que aconteceu.

Ser percebido pelo outro é estar exposto nas suas vulnerabilidades, o que faz com que se sinta fora do controle da situação. Ou pior, faz você sentir que você é a parte da relação interpessoal que está desequilibrando a harmonia enquanto o outro é o estável, o compreensivo, o evoluído. Engraçado, né? Parece uma competição de quem lida melhor com as situações.

Mas eu também não vou dizer que as pessoas fazem isso só para se sentirem superiores. Como eu já disse, pode ter um pouco de boa vontade nisso. O medo de deixar outra pessoa mal, de “atrapalhar a harmonia”, de incomodar ou seja lá do que for.

O fato é que, para si ou para os outros, boa parte das pessoas tenta ser o mais do bem e mais galera possível. A troco de que?

Me parece muito engraçado situações de rompimento em que as pessoas dizem coisas como “vou continuar torcendo muito por você” ou “só quero que você seja feliz”. Não estou dizendo que isso não é verdadeiro ou que as pessoas não devam desejar o bem uma da outra. Também não quer dizer que não existam situações amistosas em que essas frases caibam muito bem.

O que quero dizer é que nem sempre você precisa ser a pessoa evoluída que só torce pelo bem de alguém que te magoou. Seja amigo, namorado, parente ou qualquer relação em que possa haver esse tipo de mágoa.

Não desejo mal para ninguém, muito pelo contrário. Mas também não espere que eu vá empenhar minhas energias para torcer para uma pessoa que me pôs em situações ruins. Assim como não vou me empenhar para torcer pelo mal. Acho que não vou empenhar minha energia para nada que eu ache que não valha a pena. E está tudo bem, isso não é maldade nenhuma.

Mas o que posso dizer, não é? Estou tentando me desvincular do conceito de espiritualmente evoluída e me permitir sentimentos ruins também.

Vi uma vez algo sobre inteligência emocional não ser sobre não sentir algo, mas sobre saber lidar com os sentimentos que aparecem, é exatamente esse o objetivo do texto. Não falo de nutrir ou destilar ódio, mas de admitir quando sinto algo que me deixa mal e falar antes que exploda.

Ninguém é superior por ser só gratidão, compreensão e altruísmo se não estiver fazendo bem para si mesmo. Isso parece mais uma busca por validação do que algo genuíno. Seu amor por alguém não diminui se você se colocar em primeiro plano.

Então, se permita sentir. Bom ou ruim. Se permita sentir e expor sem medo de parecer bobo, incômodo ou muito emocional (um dia ainda quero entender como foi que ser emocional se tornou algo ruim, sério).

Se permita, porque expressar o que sente é o melhor que se pode fazer por alguém e, claro, por você.